Em consulta deparei-me várias vezes com situações em que a criança procurava alimento, não por necessidade fisiológica mas por carência ou stress emocional. A denominada “fome emocional” no adulto já me era familiar, no entanto, desconhecia esse comportamento em idade pediátrica, por isso, resolvi investigar.

Em todas as fases do desenvolvimento da criança, a alimentação saudável é um fator determinante para o crescimento e promoção da sua saúde. Uma vez que a criança ainda não é capaz de escolher os alimentos em função do seu valor nutricional, os educadores, pais, tios, avós ou outros, desempenham um papel fundamental na sua educação alimentar..

As crianças, assim como os adultos, podem usar os alimentos por outras razões que não apenas a satisfação da fome.

Entre os quatro e os seis anos, a tendência a comer emocionalmente pode aumentar e, mais tarde jovens obesos tendem a comer frequentemente em resposta às suas emoções.

Cerca de três quartos das crianças obesas continuarão obesas em adultas. Comer emocionalmente é um factor que tem sido relacionado não só com obesidade, mas também com o desenvolvimento de transtornos alimentares.

A procura por alimentos mais doces ou salgados tem, na verdade, uma explicação fisiológica. Este tipo de alimentos aumentam os níveis de serotonina que, por sua vez, ativa áreas do cérebro relacionadas com o prazer, funcionando como uma recompensa.

A recompensa alimentar é um fenómeno comum, que tem início no nascimento. Se reparar, o choro de um bebé é tipicamente acalmado com leite materno ou fórmula infantil. Nos aniversários e feriados, quando as crianças estão em família, recebem várias vezes alimentos doces ou salgados como símbolo de amor e carinho. Noutras situações, como longas viagens, se estiverem aborrecidas ou cansadas, a oferta de algo doce é frequentemente usada para melhorar o seu estado de ânimo. Avaliações escolares ou até a má integração com os colegas de escola, podem realçar a procura por comida de forma compensatória. Há realmente muitos motivos que induzem as crianças a escolherem alimentos mais calóricos. Raiva, tristeza, solidão, stress, fadiga, medo, frustração, e aborrecimento, parecem ser os mais comuns.

Alguns pais inadvertidamente contribuem para a obesidade dos filhos, recompensando-os com alimentos. No entanto, existem outras formas mais saudáveis ​​para tal. Nas crianças mais pequenas, por exemplo, experimente dar-lhes autocolantes, levá-las ao cinema, ao teatro, ao parque infantil, experimente brincar com elas ou jogar um jogo, comprar um brinquedo, enfim, seja criativo. Para as ajudar a ultrapassar essa questão, não ignore a importância do elogio verbal. As palavras de aprovação ajudá-las-ão a manterem-se motivadas e a melhorarem a sua auto-estima para continuarem a tomar decisões correctas. Se notar que andam desmotivadas, incentive-as a seguir em frente, a focarem-se oferecendo o apoio de que necessitam.

Muitas pessoas acreditam que vivemos em uma “sociedade obesogénica”, onde o ambiente à volta do ser humano evoluiu para a promoção da obesidade ao invés de apoiar uma alimentação saudável.

Saiba, no entanto, que mesmo que se eliminem todos os vínculos entre comida, emoção e recompensa em casa, a realidade é que a sociedade está repleta de situações em que as crianças serão confrontadas com alimentos densos em calorias como parte de celebrações. Para combater esse problema, a maneira como educa os seus filhos e os alimenta será tão importante quanto o tipo de alimento que lhes fornece.

Explicar e relembrar a diferença entre fome fisiológica e fome emocional, ensinar as crianças a administrarem seus apetites ou seja, a comerem se estiverem com fome e a pararem quando saciadas, é uma lição importante que tende a ser frequentemente ignorada.

Paula Beirão Valente

1167-N Mestre em Nutrição Clínica pela FMUC e licenciada em Ciências da Nutrição pela FCNAUP

Fonte: Revista “Crescer”